segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

"Quem mata um homem, mata toda uma humanidade". Alcorão.

Eu ando muito confusa em me posicionar para determinados assuntos. São muitas informações. E das que eu tenho buscado ler, muito contundentes, profundas, sérias. Às vezes vou pelo sim; às vezes pelo não; e me acabo no talvez. Nem preto, nem branco. E nem cinza.

Acho que minha percepção mudou depois que eu vi uma entrevista da Marisa Monte, em que ela disse - falando sobre o trabalho "Verdade uma Ilusão" - que não existe a verdade; mas uma versão. Que verdade é  atribuição de um único indivíduo - se o fato foi visto por uma segunda pessoa, já vira versão. Achei simples e genial. E tem me ajudado bastante no árduo exercício de não julgar - quem e o que quer que seja; e de como tem sido muitas vezes ingrato e incoerente essa condução de me afastar, principalmente daquilo que não cabe a mim.

E, afinal, o que é que cabe a mim? A você? Aos que nos são queridos?

Quando eu aprendi a lidar com os muçulmanos e a amá-los; sim, a atribuir-lhes afeto, a entender a forma deles de amar; de sorrir, de não condenar, de percebê-los pais, irmãos, mulheres, irmãs, filhas, amigas; quando eu vi e vivi - não assisti em filme ou uma reportagem de telejornal, eu vivi isso! - eu respeitei. E quando eu não podia concordar mais, quando aquilo não cabia mais em mim e não me trazia mais sentido, eu parti - com muita dificuldade, eu abracei cada um daqueles que pude e, com todo meu coração, desejei a eles uma vida mais digna, mais feliz; para o meu conceito de felicidade, mesmo sabendo que eles se dizem (já) ser.

Quando, meses depois, Tripoli foi bombardeada e familiares de amigos muçulmanos perseguidos ou sequestrados, ou desaparecidos, eu chorei  e, connecting the dots, que coisa é o futuro, meu paralelo à época foi com Paris

Hoje, a confusão mental e emocional está de volta. O conflito amor e ódio. Guerra e paz. Compaixão e raiva. Tristeza. Dor. E, embora Jornalista, Je ne suis pas Charlie

Quando eu estava recém integrada na Faculdade, o Jornalista Tim Lopes foi morto enquanto fazia um trabalho de apuração (para denunciar) o narcotráfico na Favela do Alemão. Aquela morte bateu forte em mim. Pela primeira vez entendi a profissão como algo corajoso, bravo, heroico, sério, inteligente, socialmente responsável; que exerce a nobre missão de levar a conhecimento do mundo questões veladas.

Com os desdobramentos da morte de Tim, tivemos uma avalanche dessa mesma discussão sobre "Liberdade de Imprensa" - e Expressão - e me lembro que a dúvida do meu posicionamento era clara quando li que o Tim Lopes não havia sido morto como Jornalista, mas como Policial. Que ele não estava ali como um "cidadão-comum", mas como um Jornalista (quase) a serviço da Polícia - e a retórica volta: Jornalista não pode, mas Policial pode? Ou Policial pode e Jornalista não pode?

Quase 13 anos depois, parece que as pessoas não entenderam que não existem categorias: existe gente. 

Não está mais errado pelos assassinos serem muçulmanos - se fossem católicos, seria diferente? 
Não está mais errado por ter sido na França - se fosse na Coreia do Norte, menos mal?
Não está mais errado por terem sido Jornalistas, Cartunitas - se fossem "cidadãos comuns", como alegaram na época de Tim, tudo bem? 
Aliás, quantos "cidadãos-comuns" são brutalmente assassinados por dia no Brasil e pouco (ou quase nada) nos mobilizamos? E, sim, me coloco nessa conta. 

A (des)humanidade me deixa perplexa. Apontamos demais, resolvemos de menos. Justificamos. Nossas intenções seguem vazias de fazermos mais e melhor. Apenas falamos. Sim, estou nesta conta.

Bem, Je ne suis pas Charlie.  Je ne suis pas Tim Lopes. Não sou "Somos Todos Macacos". Je ne suis pas musulman. Je suis un être humain.  Je suis en faveur de la paix*.

Mas, né, Marisa, esta é só a minha versão.

*Não sou Charlie. Não sou Tim Lopes. Não sou muçulmana. Sou um Ser Humano. Sou a favor da paz.
*Não adesão à nova regra gramatical.