quarta-feira, 3 de abril de 2013

A manada no metrô de São Paulo


"(...) Do Brasil, SoS ao Brasil
Do Brasil, SoS ao Brasil
Do Brasil, SoS ao Brasil (...)"
Querelas do Brasil - Maurício Tapajós e Aldir Blanc


Fazia muito tempo que não andava de metrô naqueles horários impraticáveis. Mas nesta época, os horários eram mais ou menos entre 06h e 08h, manhã e 18h às 20h, tarde/noite.
Naquele dia o relógio marcava pouco depois de 16h e já na entrada da estação me assustei com o corre-corre: cheguei a pensar que algo tinha acontecido, que aquele seria o último trem daquele dia. Fiquei atenta, até então, somente. 

Depois de algumas estações, "baldiei". Revivi a sensação do tal "formigueiro humano". Três trens pararam e não consegui entrar. Na quarta vez, também não entraria se não fossem os empurrões, aliás, sucção. Era um caminho sem volta. Eu tentei relutar, me esforçando contra a manada, mas eu era literalmente uma formiga, prestes a ser esmagada. Ali dentro,
fiquei imóvel por algumas estações, até que numa delas, senti meu braço saindo pela porta, junto com a bolsa que carregava. Não sabia se gritava, se empurrava de volta, se tentava manter meu braço comigo, se me preocupava com a bolsa. Durante estes segundos, vi um homem ser cuspido pela porta, até que a manada passasse e desembarcasse ali. Eram centenas de pessoas sendo vomitadas pela porta, por frações de segundo. Com muita força, recuperei minha bolsa e uma espécie de dignidade.

Quando por fim as portas se fecharam, os sobreviventes puderam respirar, vi uma senhorinha, frágil, em pé. E outras pessoas sentadas, fingindo dormir, de olhos fechados. O cansaço de brigar por um espaço foi substituído por uma força doce. Me aproximei dela e perguntei se podia fazer algo, se ela demoraria a descer. Ela sorriu e disse "operei meu braço ontem. Desço na próxima".  

Qual o número para o resgate de uma vida melhor? Com quem se fala? O que eu faço?: Chove, alaga. Faz calor, desidratam. Saem mais cedo, passam por cima. Envelhecem, ignoram. Tudo acontece, acostumamos. É assim. Fica assim. Sempre foi assim.

*Não adesão à nova regra gramatical.