sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Ainda ensaiando - O que você quer ser depois de ter crescido?


Quando fiz vestibular, no fim do ano de 2002 e início de 2003, eu achava que eu queria ser Jornalista para fazer vídeo documentário e ser uma mulher a lá Eduardo Coutinho. Nove anos depois, há um mês de me demitir de uma empresa que estava há léguas de distância do Jornalismo e de todo o sonho que viria com ele, entendi, assistindo a um filmezinho despretensioso*, que "tentar ser [bem sucedido] como um homem, seria desperdiçar uma mulher": sensacional, isto aí - adorei a sessão, inclusive - e cheguei a provocar estes "quereres", como diria Caetano, no "Mulheres que o quê"?.

Com o tempo livre, em busca dessa coisa que eu não sei o que é, nem você, nem ninguém, e por isso somos tão insatisfeitos, encontrei, virtual e fisicamente, várias pessoas na mesma situação que eu - em grande parte, jovens. Dezenas de amigos, colegas, conhecidos, irmãos ou filhas de alguém que não sabem o que fazer com a graduação, com o trabalho, com a rotina, ou com as aptidões. Com as escolhas que fizeram lá atrás. Ou no ano passado.

Comecei a pensar - pois é!; ócio criativo! - e a concordar, em partes, com aqueles que dizem que "nossa geração" é uma "geração perdida". Nem tanto ao mar, nem tanta à terra, e salvemos nossa (vã) filosofia, fico querendo saber se um dia vamos diminuir esta pressão em fazermos algo para sermos alguma coisa daqui a algum tempo, que não sabemos quando é e nem o que é, exatamente.

Se há quatro anos eu mudava de atividade, emprego, ou que seja lá que nome for e hoje me encontro assim, quiçá há 10 anos, quando fiz um "x" num papel que me trazia a opção que me parecia ser... sei lá o que: glamourosa? 

Dias atrás, durante o Carnaval, encontrei outras pessoas interessantes, algumas mais novas ainda, do que eu. Uma delas eu sabia que tinha sido capa de uma Revista de Negócios no Brasil e protagonista de n reportagens sobre "vencer os processos de trainee" de grandes empresas. Curiosa, fui toda-toda, durante um intervalo entre-blocos do Carnaval do Rio de Janeiro, perguntar ao "garoto", como estava a vida dentro da vitrine - e eis que veio:

- Ah, Babi, pedi para sair da empresa: nada a ver!
- Mentira! Sério? Como assim? Para quem está de fora, lá dentro sempre me pareceu ser tão legal! - e foi tudo o que consegui dizer, até que ele explicasse as considerações.

Acho que esta conversa foi quase uma gota d'agua para eu conectar em linha os últimos pontos:

- As tais características A, B, C, D e etc da geração Y trazem algo mais: elas vêm com frustrações de gerações que não tiveram tanta opção de escolha, mas sobretudo, não tiveram o privilégio de sentir o que seria melhor para si e para quem quer que fosse - acho que a Antroposofia está de volta e os jovens, principalmente, estão famintos por resgatarem a teoria de que são/somos de fato "seres espirituais passando por uma experiência humana", e que ser feliz e saudável e responsável socialmente faz parte do todo, de um conjunto, de um objetivo além de fazer dinheiro - por si só;
- A propaganda e a venda da idéia de um "mundo dos sonhos" em uma instituição, seja empresa ou não, é também efêmera: o discurso das palestras, a imagem dos cartazes precisam ser sustentados diariamente, senão,  sentindo-se "enganados", os jovens das características-mil se vão mesmo;
- Os mecanismos atuais para manter alguém a médio ou longo prazo se torna cada vez mais intangível: "os seres espirituais" querem liberdade para decidirem, confiança para participarem de compartilhamento de informações, "incivilidade", retorno sobre como são e como agem. Querem(os) sentir que somos tudo aquilo que disseram que éramos ao passarmos pela tal vitória dificílima do processo seletivo - quase um novo nascimento, porque não deixa de ser um começo: não basta ser capa de Revista, tem que participar.

A questão de listar que a força de trabalho é de certa maneira resultado de adjetivos pomposos e bonitos não satisfaz: mais do que ser, é preciso estar: estar motivado, interessado, contribuindo, sendo e deixando de ser, recomeçando, recriando, ouvindo, sendo direcionado. Tendo referência e exemplos positivos. Proximidade. Acompanhamento. Perspectiva. Coerência - aliás, os "RHs" poderiam acompanhar o "pós-venda" do Processo Seletivo; talvez "descubram" os gargalos da famosa "taxa de retenção" e a insatisfação do "gasto x retorno satisfatório obtido". Ou melhor, talvez fotografem o pulo-do-gato, vendido como lebre, e gerencialmente envolvam as lideranças todas a serem aqueles dos cartazes e dos vídeos institucionais promovidos.

Se é verdade - e eu particularmente acredito que seja - que "as empresas contratam por curriculo, mas demitem por comportamento", diria que as pessoas selecionam pela aparência, mas se constroem coerentemente pela essência - principalmente por aquela, que já compartilhei também, do Saramago: de fazermos, o que quer que seja, simplesmente para que ecoe pela eternidade - as empresas se mostram nas vitrines, muitas vezes de luxo, mas apresentam algo paupérrimo e acaba se tornando passageiro: o tempo trouxe com suas mudanças a inversão da ordem e da lógica de quem captura e de quem é capturado.

Mais uma vez, curiosa e surpreendentemente, isto me faz voltar ao ponto de partida e ao que se torna, do meu ponto de vista, o desafio e a resposta para o tal futuro, tão comentado, mas ainda descolado do nosso dia-a-dia e da nossa prática cultural de ser para o trabalho:

Empreendedor [1 Que empreende. 2 Que se aventura à realização de coisas difíceis ou fora do comum; ativo, arrojado. sm 1 Aquele que empreende. 2 Aquele que toma a seu cargo uma empresa].
Michaelis. 

Enfim, como o que mais importa não é a resposta, mas a pergunta, depois de nos termos tornados médicos, professores, bancários, analistas, autônomos, concursados, administradores, engenheiros, técnicos, discriminadamente "nada", jornalistas, publicitários, zootecnistas, agrônomos, especialistas, generalistas, diretores, gerentes, aposentados, astronautas, pilotos, atores, escritores, cineastas, cantores, burocratas, policiais, músicos, palhaços, políticos, advogados, juízes, malabaristas, sociais, trainees número 1, vestibulandos, estudantes, amadores, adultos e tudo o mais, enfim, nós fomos, somos e realizamos o que - mesmo?

*Não sei como ela consegue

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Um ensaio - do que adianta a minha e a sua?

 "(...) Rapidamente vêm novas turbulências, revelando motivações humanas muito diversas, mais obscuras, mais familiares, e voltamos a nos perguntar se nossa espécie, por assim dizer, não atingiu o limiar de sua incompetência moral, se continua a avançar ou se não deu início a um movimento de regressão que ameaça recolocar em questão aquilo que tantas e sucessivas gerações se esforçaram para construir".

Este é um trecho do livro "O mundo em desajuste - quando nossas civilizações se esgotam", do Libanês Amin Maalouf, publicado pela primeira vez em 2009, mas que poderia ser, facilmente, o primeiro parágrafo de qualquer primeira página de jornal do Brasil hoje ou ontem - e porquê não, do mundo?

Uma mulher é morta pelo marido (supostamente) na casa deles, em um cômodo ao lado ao que estavam os filhos. Na mesa do bar, comentamos sobre as outras suposições, depois que o marido foi encontrado morto (supostamente, suicídio). Entre tantas suposições, nos presumimos que teria sido melhor se ela tivesse sido vítima de uma assalto, sequestro ou coisa parecida. Só depois me dei conta do quanto isto reflete que estamos ficando acostumados em saber de certas notícias e que o que chocava antes , já não choca tanto agora, dependendo da ótica que se olha: uma outra morte ou agressão fica sendo mais do mesmo, diante de uma destas.

Mas um assassinato, qualquer que seja, deve assustar e deve trazer o sentimento de indignção; ou qualquer outra coisa que te motive a fazer alguma coisa - positiva, por favor! -, ao invés de trazer (somente) perplexidade e acúmulo de "mas não foi a primeira vez" e "os números sobem para XXXXX": que números, ô!?

A recorrência com que estas brutalidades vêm gerando notícias  e até  mesmo o volume de denúncias de corrupção que caracterizam a nossa história e as pessoas que dizem construir o Brasil estão chegando a banalidade - são tantos que a gente não se incomoda  (na mesma proporção): "a vida segue"!
A gente se assusta, comenta no bar, mas depois do quarto copo já muda de assunto e só volta a se lembrar dele na hora de dormir, pedindo a Deus que tragédias como estas, e outras, passem longe da minha família. Da sua família. Dos seus amigos. Dos meus. Dos nossos. Amém.

E aí, as redes, que poderiam desempenhar um papel mais social, trazem inutilidades ainda mais banais e boa parte dos indignados desistem da missão, "porque não vai dar em nada" - me incluo nesta, não se preocupem. Às vezes, por outro lado, me sinto como Maalouf  -  o Amin: "(...) Antes de tudo, é simplesmente a preocupação de alguém que ama a vida e não quer se resignar ao aniquilamento que ameaça (...)".

Mas aí, no fim da contas mesmo, eu faço das palavras da Ruth de Aquino em "A palavra e o sexo" (Revista Época, 23 de Janeiro de 2012) as minhas: "(...) Mas de que adianta a minha opinião?".
*Não adesão à nova regra gramatical.